Supremo Tribunal Federal

Pesquisar este blog

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Cinco nãos à CPMF


OPINIÃO
Cinco nãos à CPMF
Imposto extinto em 2007 tornou-se símbolo da excessiva carga tributária brasileira e da má utilização dos recursos públicos

Autor: Guilherme de Almeida Henriques - Advogado, vice-presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB-MG
           

Tema exaustivamente explorado durante as campanhas eleitorais, a necessidade de promover uma reforma tributária ampla que simplifique o sistema tributário nacional e desonere a produção foi bandeira levantada por todos os partidos e candidatos, postulantes a cargos legislativos ou executivos, estaduais ou federais. Encerrada a apuração, iniciou-se novo debate, agora, sobre a recriação da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), iniciativa que implica verdadeira traição aos ideais democráticos, uma vez que demonstra total falta de compromisso com as propostas apresentadas.

Além de ser demasiadamente gravosa, essa cobrança é mal distribuída, pois apenas 3% dos valores arrecadados decorrem dos chamados impostos sobre o patrimônio, enquanto nem 20% do bolo tributário são compostos por tributos incidentes sobre a renda e o lucro. Já a tributação sobre o consumo, que atinge de maneira indiscriminada pobres e ricos, é responsável por quase metade de toda a arrecadação, que este ano já superou a marca de R$ 1 trilhão. Ainda que instituída com a nobre finalidade de destinar recursos para a saúde pública, a utilização pelo governo federal de mecanismos como a Desvinculação das Receitas da União (DRU) permite que os valores arrecadados com a CPMF sejam destinados a outros fins, como o pagamento de dívidas. Além disso, a falta de transparência na aplicação desses recursos, aliada à caótica situação da saúde pública no país, mesmo depois de 10 anos e mais de R$ 200 bilhões arrecadados, demonstra, de maneira clara, a ineficiência da administração pública na gestão dos recursos por ela gerados.

A CPMF tornou-se símbolo da excessiva carga tributária brasileira e da má utilização dos recursos públicos, o que levou à sua extinção em 2007, não obstante as tentativas do governo federal de prorrogar indefinidamente sua cobrança. Em 2008, sobre o codinome de Contribuição Social para a Saúde (CSS), tentou-se, sem êxito, ressuscitar a malsinada contribuição. À época, essa tentativa foi rechaçada pela população, que promoveu diversas manifestações para exposição dos motivos pelos quais não desejava a volta do imposto sobre o cheque, sendo que tais motivos continuam pertinentes até hoje: 1) até o fim do ano, o país arrecadará R$ 1,27 trilhão, segundo levantamentos do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), o que representa um recorde histórico, mesmo considerando os tempos da antiga CPMF, o que a torna desnecessária; 2) CPMF tributa indiscriminadamente todas as movimentações financeiras, sejam elas decorrentes de pagamento de salários, de investimentos, reembolso de despesas, do consumo e produtos e serviços ou mesmo do pagamento de outros tributos, o que a torna confiscatória; 3) a CPMF retira recursos da iniciativa privada, que responde por 62% do Produto Interno Bruto (PIB) e mais de 75% dos empregos do país, para entregá-los a uma administração pública ineficiente e pouco transparente, que durante 10 anos arrecadou mais de R$ 200 bilhões com essa contribuição, sem ter apresentado as respectivas contrapartidas, o que a torna inibidora do crescimento econômico; 4) a CPMF é um tributo cumulativo, que incide em todas as etapas da cadeia produtiva, ou seja, onera desde a matéria-prima até o consumo, causando um nefasto efeito cascata que privilegia a verticalização da produção pelas grandes empresas em detrimento dos pequenos produtores, o que a torna discriminatória; 5) a ausência de graduação de alíquotas faz com que a CPMF tribute da mesma maneira todas as movimentações financeiras, sem fazer qualquer distinção entre as quantias movimentadas, o que afronta o princípio constitucional da capacidade contributiva, que exige que os tributos sejam cobrados segundo a capacidade econômica do contribuinte.

Fala-se muito sobre a função fiscalizatória da CPMF, que, cobrada por meio de alíquotas mínimas, serviria como um instrumento de combate à sonegação fiscal. Sobre esse argumento, entendemos que, caso se autorize a recriação dessa contribuição, dificilmente, o governo federal se contentará com a arrecadação de alíquotas mínimas. Ademais, a Receita Federal já tem acesso aos mais diversos dados do contribuinte (desde a compra de imóveis e veículos até despesas com cartões de crédito), por meio das declarações eletrônicas, o que enfraquece essa alegação frente ao risco que a recriação desse tributo representaria para a economia nacional.

Publicado no Jornal Estado de Minas - 08/12/2010

Nenhum comentário:

Postar um comentário